sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

De repente, mãe

De repente sua fruta favorita virou a outra metade da laranja que o seu filho não quis comer, sua roupa preferida aquela que te permite subir e descer, correr e pular, sentar e levantar sem pagar peitinho ou cofrinho e o programa de TV que você mais assiste é um algum desenho animado que mantenha seu filho entretido.

Aí você se pega escovando os dentes com creme dental infantil (ah, a minha acabou mesmo e depois eu compro outra) e escolhendo restaurantes não pela qualidade da comida mas sim pela qualidade da área kids. Sem falar na sua geladeira: iogurte, danoninho, yakult - mas cadê aquela cervejinha gelada? E tem também aquele palavrão gostoso que você xingava quando batia o mindinho em algum móvel da casa, agora substituído por um "ai, seu bobo"!

A bancada do banheiro, antes habitada por anti-sinais, anti-rugas, anti-stress, anti-tudo agora deu lugar a todo e qualquer tipo de pomada que prometa acabar com assaduras no menor espaço de tempo. E você já experimentou um pouquinho de todas e ainda compra mais uma outra, recomendada por uma amiga, que disse que a pomada foi milagrosa para o bebê dela.

É, você agora é mãe.
Sim, você passa por tudo isso.
E ama muito seu filho. Eu também amo muito os meus.

As pessoas dizem: "é assim mesmo, faz parte, agora você é mãe".  É como se você recebesse uma chave para entrar em um mundo novo e, com essa mesma chave, você trancasse para trás o seu mundo antigo. E a passagem por esta porta dói muito. E a gente não fala sobre isso. Pelo contrário, a gente posta fotos para provar (para nós mesmas) como somos felizes!

E nesse jogo do "agora você é mãe", nós vamos nos deixando para trás enquanto tentamos enfiar nosso verdadeiro EU em um molde de algum passo a passo de internet com pitadas montessorianas. E esse molde não nos cabe. E aí dói mais ainda. E a gente não fala sobre isso.

Ser mãe dói. Porque a mãe esquece que ela é gente. Vira super-herói, tipo aqueles de TV que salvam o dia e você nunca pára para pensar: mas ele dorme, come, faz xixi, tem fome e frio? Alguém, por acaso, já ouviu dizer que o Batman está com caganeira e não vai fazer nada em Gotham City aquele dia? Isso mesmo. A gente não fala sobre isso. E dói.

Mãe também é gente. É isso que eu preciso dizer e escancarar para o mundo: mãe tem preguiça, mãe tem ressaca, mãe tem tesão. Mãe, às vezes, quer sumir do mapa. Mãe, é mais um papel que a gente desempenha e que não anula todos os outros que já desempenhávamos antes. Porque quando os outros papéis são anulados, aí é que a dor fica crônica. E a maternidade fica pesada, cinza e mais dolorida do que o suportável.

Por isso, mães, uni-vos: cuide de você em primeiro lugar. Seja a sua prioridade. Escove os dentes com creme dental de adulto. Encha a cara de vez em quando. Escolha um restaurante por você e para você. Feche os olhos e lembre quem você é, acima de tudo. Seu filho vai agradecer pela mãe feliz, equilibrada e real que ele vai ter.

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